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Notícias

28/03/2019

AEE nas escolas

Superar a violência a partir da convivência

Superar a violência a partir da convivência

Por: Bárbara Batista

Conheça a experiência de escolas que reduziram o histórico de conflitos após priorizar o diálogo com a comunidade e a participação estudantil

Após um episódio de violência, é comum que as escolas busquem por mais segurança reforçando mecanismos de controle, vigilância e punição, sustentados por um modelo disciplinar de Educação. Na contramão deste modelo, experiências exitosas pautadas no Diálogo Igualitário vêm se apresentando como caminhos eficazes para resolver conflitos e prevenir a violência no ambiente escolar.

Modelo Dialógico de Prevenção e Resolução de Conflitos é uma das sete Atuações Educativas de Êxito de Comunidade de Aprendizagem recomendada pela pesquisa Includ-Ed, que, após 5 anos de estudos, sistematizou práticas exitosas para promover a aprendizagem e a coesão social em contextos de vulnerabilidade.

Ricardo Paim, pedagogo e formador do Instituto Natura, diferencia violência e conflito, e destaca a importância de encararmos os conflitos como oportunidades de diálogo, desenvolvimento e aprendizagem. “Para a violência, nossa intolerância deve ser total. Para o conflito devemos ter muito maior condescendência, isto porque o conflito é inerente à condição de humanidade e pode representar, para nós educadores, a oportunidade para a construção do diálogo e da cooperação”, defende.

Para resolver conflitos e evitar que estes desemboquem em situações de violência, sejam elas físicas ou simbólicas, o Modelo Dialógico de Prevenção e Resolução de Conflitos se estrutura a partir de duas práticas centrais, amparadas no princípio do Diálogo Igualitário: as assembleias e a construção consensual das normas de convivência. Algumas experiências de escolas relatadas a seguir nos ajudam a compreender como estas práticas acontecem.

 

Priorizar o diálogo

Assembleia de Estudantes na escola Luis Carlos Galán, em Itaguaí, Colômbia

Abrir a escola para a comunidade e criar espaços institucionais de participação estudantil foram as medidas centrais encontradas pela EMEB Antonio Pinto de Campos, em Cajamar (SP), para começar a inverter o histórico de depredação e violência anterior. Em 2014, uma situação de agressão culminou com a intervenção da Polícia Militar e estremeceu ainda mais as relações já frágeis estabelecidas entre escola e comunidade.

“Quando eu cheguei, em 2015, me chamou atenção a quantidade de pais que foram à escola para colocar suas angústias. Eu digo que eu não perdi, mas eu ganhei muito tempo ouvindo as famílias que sentavam lá”, conta Maria da Cruz Sousa Santos, que dirigiu a escola até o fim de 2018. “Houve um ganho muito grande ao priorizar a escuta”, acredita.

Em 2015, a gestão da Antônio Pinto iniciou uma discussão para elaborar um regimento interno e, a partir dos critérios do Modelo Dialógico de Prevenção e Resolução de Conflitos,  estabelecer normas de convivência que atendessem a realidade da escola e contassem com a contribuição de estudantes e familiares em sua elaboração.

Veja aqui os 7 passos para construção consensual das normas de convivência

“Todo começo de ano, a gente pega este documento, apresenta para todas as turmas e revisa com os estudantes na primeira Assembleia Estudantil. Depois que os estudantes fazem as alterações, a gente faz o mesmo processo na primeira reunião de pais. É um documento vivo, que todo ano vai se adequando à realidade da escola”, explica Maria.

Tal dinâmica criou um padrão na escola para orientar com mais clareza a postura da gestão e do corpo docente diante de situações de conflito ou violência, e ajudou a gerar uma postura mais responsável dos estudantes em relação às normas.

 

Encarar os conflitos

Para a ex-diretora, não é possível educar integralmente sem lidar com os conflitos que se reproduzem dentro da escola. “Quando a criança ou o adolescente entra na escola, ele não larga a personalidade do lado de fora, ele não larga os problemas do lado de fora, como nós adultos também não. E, naquele momento, a gente é um todo que precisa conviver e que tem a tarefa coletiva de lidar com toda essa diversidade das pessoas”, argumenta Maria.

Segundo Marcos Brito, professor de Geografia da EMEB Antonio Pinto, brigas e provocações ancoradas em preconceitos - como o racismo, o machismo, a homofobia e toda espécie de bullying - são os tipos de violência mais comuns reproduzidos no interior do ambiente escolar. Estes conflitos não são gerados na ou pela escola, mas se reproduzem ali e ignorá-los não vai fazer com que deixem de existir.

Leia também: Socialización preventiva de la violencia de género

“Provocar o outro, ofender o outro, tripudiando de uma condição de vulnerabilidade não pode ser tratado como algo normal”, afirma Marcos. O educador considera que se este tipo de violência simbólica não for resolvido nesta fase, pode deixar marcas profundas na vida adulta destes estudantes.

Compartilhar com as crianças e adolescentes a responsabilidade e a capacidade de gerenciar a convivência é um dos caminhos apontados pelo Modelo Dialógico de Prevenção e Resolução de Conflitos. Na escola Antonio Pinto, as turmas se reúnem mensalmente em Assembleias de Classe, acompanhadas por um(a) professor(a)-coordenador(a), para conversar sobre problemas ocorridos no último mês e encaminhar soluções que serão conduzidas e monitoradas pelos próprios estudantes.

O ideal é que, com o tempo, as escolas se organizem para garantir assembleias quinzenais ou semanais. Na escola Loma Linda, localizada no município de Itaguí, na Colômbia, as Assembleias de Estudantes acontecem uma vez por semana, mas em dias alternados: começam na segunda-feira, na semana subsequente acontecem na terça, depois na quarta, e assim por diante. Isso ajuda a manter a regularidade do encontro e evita que as reuniões ocupem sempre o horário de uma mesma aula.

Juliana Betancur, estudante do 6º ano da escola Loma Linda, em Itaguaí, Colômbia

Após participar das assembleias, a estudante do 6º ano, Juliana Betancur, que já sofreu bullying por conta do seu peso e teve uma experiência escolar marcada por raiva, rancor e solidão, relata que os espaços de diálogo com a turma lhe permitiram perceber que não precisava se isolar e que podia confiar em seus colegas. “Hoje eu me impressiono comigo mesma porque nunca pensei que eu iria mudar”, diz.

Também no município de Itaguí, na escola Luis Carlos Galán – premiada em 2018 pelo “Reconhecimento REDUCA a Práticas Inovadoras em Educação com ênfase em Convivência Escolar” – são visíveis os impactos positivos nas relações de convivência trazidos pelo Modelo Dialógico. “Me enche o peito saber que o ano terminou e que foram conquistadas tantas coisas, e que são solidários entre eles”, afirma a professora Piedad Astrid Grisales.

Veja o vídeo em espanhol com o registro das duas experiências em Itaguí:

 

A escuta e a empatia exercitadas em espaços institucionais de diálogo como as assembleias permitem que os participantes enfrentem temas fundamentais para melhorar o clima das salas de aula.

“[Nas assembleias] eles discutem o bullying, discutem as piadas preconceituosas, e isso vai mudando a postura dentro da sala”, afirma Marcos. A estudante Evelyn Oliveira dos Santos, que terminou o 9º ano na EMEB Antonio Pinto no ano passado, conta que após um menino tentar agredir uma menina na escola, estudantes debateram o caso em assembleia e criaram um projeto para tratar do machismo dentro da sala de aula, por exemplo.

Em 2018, Evelyn foi escolhida entre alunos e alunas de diferentes escolas do município para representá-los na Conferência Lúdica da Criança e do Adolescente de Cajamar. Conhecida por ser uma garota tímida, ela compreendeu a importância do protagonismo para se fazer ouvir e foi esta a pauta que a levou até a Conferência. “Eu aprendi a perder a vergonha”, diz sorrindo.

A estudante Evelyn Oliveira dos Santos, a ex-diretora Maria da Cruz e colegas da escola Antonio Pinto, na Conferência Lúdica da Criança e do Adolescente de Cajamar (SP/Brasil)

Hoje, a estudante tem certeza de que a experiência de diálogo e participação que começou a mudar o clima da escola, também a transformou. “Agora eu sei me expressar, eu sei dar minha opinião sem agredir alguém, eu sei ser educada com quem não é educado comigo, porque a Evelyn do passado não era educada com quem não era educado com ela. Eu me tornei uma pessoa bem diferente”, assegura.

Aos poucos, os vínculos estabelecidos por meio do Diálogo Igualitário e da participação mais ativa de todos nas decisões tecem os caminhos para vencer o clima de desconfiança e melhorar as relações. Nos últimos anos, a escola Antônio Pinto reduziu consideravelmente a quantidade de ocorrências ligadas às agressões e depredação.

“Eles estavam quebrando a escola porque não gostavam da escola. Este processo de ouvir, de respeitar esta fala e entender o que estava por trás dos conflitos foi fundamental”, defende Maria. A mudança de postura, segundo a gestora, não se dá porque alguém obriga, ou por medo das sanções, “mas porque agora eles têm o entendimento de que o espaço é deles”.

Embora ainda incipiente, os resultados desta mudança nas relações entre estudantes, professores, gestores e familiares começam a impactar nos índices de aprendizagem. No ano passado, a escola aumentou para 25 o número de aprovados no vestibulinho da ETEC em Cajamar. "A gente estava numa escola que nem discutia a criança fazer uma prova para entrar no ensino técnico e agora temos aprovados", comemora Maria.


Saiba como implementar o Modelo Dialógico de Prevenção e Resolução de Conflitos:

 

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